Um recital para Ariano

By Antonio Nóbrega | 12 janeiro 2015 | Sem Comentários

Já lá se vão mais de quarenta anos desde o momento em que Ariano convidou-me para integrar o Quinteto Armorial. Dessa ocasião até praticamente a sua morte, além da boa convivência e amizade que sempre cuidamos em manter, estabelecemos também um vínculo artístico que se materializou em algumas peças musicais.Essas músicas foram tanto diretamente referenciadas em suas obras literárias – particularmente na Pedra do Reino – quanto, de modo indireto, inspiradas nas prazeirosas conversas que tivemos ao longo dos anos. Não é por outra razão que a apresentação que farei no próximo dia 17 de janeiro, às 20h, no Theatro Municipal de São Paulo, como parte do projeto “Ariano Suassuna – Arte como Missão”  também se constitui  numa espécie de recital sentimental.

Um  recital composto de romances, poemas, martelos agalopados, excelências, toques instrumentais marcados  pelo visão de um homem do sertão. Ou melhor, pelo espírito de um homem que, juntamente com Euclides da Cunha e Guimarães Rosa, transfigurou uma região seca, áspera e pobre no “mundo mágico, onírico e redentor do Sertão”.Essa viagem musical vai passar pelos romances A Nau Catarineta, A Filha do Imperador do Brasil, A Morte do touro Mão de Pau, pelas canções O Rei e o Palhaço e Canudos, pelas peças instrumentais Rasga e Ponteio Acutilado, entre outras. Tais obras – presentes  nos meus Cds e Dvds – serão entremeadas por falas e pequenos relatos que marcam de alguma  maneira, a minha visão do Cavaleiro da Alegre Figura Ariano Suassuna.

Para esse recital estarei acompanhado por um  quinteto formado por Swuami Jr. nos violões, Filipe Maróstica no baixo, Léo Rodrigues na Percussão,  Olivinho no Acordeom e Zezinho Pitoco no clarinete, sax e zabumba.

Uma maneira emotiva de abrir artisticamente, para mim, o ano de 2015.

Theatro Municipal de São Paulo

Espetáculo musical com Antonio Nóbrega

17 de janeiro às 20h

Retirada de ingressos na bilheteria a partir das 18h

Valor do ingresso R$ 1

Duração – 1h45

Classificação 12 anos

Praça Ramos de Azevedo s/n – centro

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Nóbrega faz apresentação surpresa no Prêmio São Paulo de Literatura 2014

By Antonio Nóbrega | 11 novembro 2014 | Sem Comentários

premio sp de literaturaO multiartista Antonio Nóbrega, acompanhado de quarteto, realizou na noite de segunda-feira, dia 10/11, uma espécie de “show de bolso” para os presentes à cerimônia em que mais tarde foram revelados os vencedores do Prêmio São Paulo de Literatura 2014, no Museu da Língua Portuguesa, na capital paulista. A apresentação surpresa foi um convite da organização do evento.

Nóbrega entrou no palco ao violino tocando “Ponteio acutilado”, primeira composição sua para o Quinteto Armorial, grupo que integrou na década de 1970 a convite do escritor Ariano Suassuna, falecido em julho deste ano. “É um prazer estar aqui nesta festa dedicada à literatura, e para a qual escolhi apresentar canções do meu repertório que conversam com esse universo”, disse Nóbrega.

Nessa toada, o público apreciou não só o cantor-compositor como também o dançarino e instrumentista versátil. As canções apresentadas foram: “A filha do imperador do Brasil”, versão musicada de Nóbrega para o romance tradicional recriado por Suassuna; “Canudos”, com base no clássico de Euclides da Cunha; e “Romance de Riobaldo e Diadorim”, inspirado em “Grande sertão: veredas”, de Guimarães Rosa. Ainda fizeram parte do show as composições “O rei e o palhaço”, “Fervo” e “Galo de ouro”.

A premiação escolheu os melhores romances em língua portuguesa em todo o país publicados em 2013. Ana Luísa Escorel ganhou na categoria Melhor Livro do Ano com “Anel de vidro” (Editora Ouro Sobre Azul). Veronica Stigger venceu com “Opisanie swiata” (Cosac Naify) na categoria Melhores Livros do Ano – Autores Estreantes com mais de 40 anos, e Marcos Peres, na categoria Melhores Livros do Ano – Autores Estreantes com menos de 40 anos, com “O evangelho segundo Hitler” (Record).

FOTO: Edson Lopes Jr





O Cavaleiro da Alegre Figura

By Antonio Nóbrega | 24 julho 2014 | Sem Comentários

Conheci Ariano em 1970 quando fui convidado por ele a integrar o Quinteto armorial. Na ocasião ele acabara de publicar o seu livro, o Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai e Volta, e foi por meio dessa obra que adentrei no Mundo Ariano. Minha ligação com Ariano foi imensamente frutífera: anos de convivência quase que cotidiana durante a fase de apresentações do Quinteto; musiquei alguns de seus poemas, representei o personagem Joaquim Simão da sua peça A Farsa da Boa Preguiça numa versão realizada pela TV Globo; inspirei-me em seus “amarelinhos” para construir o meu personagem Tonheta…E sobretudo isso: foi a partir do meu encontro com ele que minha maneira de fazer arte, entender cultura e ver o mundo ganharam outras e novas dimensões.

Ariano teve, continuará tendo, um papel absolutamente imprescindível, vital para a arte e cultura brasileiras. Foi escritor versátil – dramaturgo, romancista, poeta, cronista, ensaísta – e um misto de empreendedor, ativista e animador cultural. Todas essas suas atividades tiveram como pano de fundo a sua visceral paixão pelo povo e pela cultura brasileira, uma tão intensa amorosidade só comparável àquela de brasileiros como Mário de Andrade e Darcy Ribeiro.

Ariano há muito que vinha escrevendo o que, segundo ele, seria a sua obra síntese. Esse livro tive a oportunidade de “escutá-lo” inúmeras vezes quando o visitava. Ariano tinha um enorme prazer em ler trechos dele para nós, amigos que o visitávamos. Por alguma razão desconfiava que essa sua obra não seria publicada em vida…

O Cavaleiro da Alegre Figura ainda terá muito a nos revelar. Uma vida desse tamanho e quilate não se extingue com a morte. Como ele dizia, em tom de brincadeira, referindo-se à sua entrada na Academia Brasileira de Letras: “não quero ser um imortal, quero ser imorrível”.

O Cavaleiro da Alegre Figura tem e continuará a ter uma permanente Cadeira na grande Arena da vida.

A. Nobrega





Nascimento do Brincante II- O calhambeque-bi-bi-te

By Antonio Nóbrega | 31 dezembro 2012 | Sem Comentários

Se o espetáculo e o teatro Brincante nasceram ali no ano de 1992, o espírito brincante eu já carregava comigo desde há muito tempo.
Quando ainda era menino tinha com minhas irmãs um conjunto musical em que cantava, tocava e até vez por outra inventava de representar. Com esse grupo eu interpretava músicas de Roberto Carlos, dos Beatles, música francesa, espanhola, música clássica e também músicas minhas. Só não era realmente a mistureba do samba do crioulo doido porque samba mesmo era o que menos executávamos. Ou seja, a música que cantávamos e tocávamos era basicamente aquela que ouvíamos nas rádios, na nascente televisão e a que praticávamos na Escola de Belas Artes de Recife onde estudava violino. Ainda para reforçar a minha simpatia pelo espírito brincante, devo informar a todos que por três vezes entrei nos concursos de canto e declamação do colégio Marista, onde estudava. Tinha, acho, de doze pra treze anos. Pois bem, durante os consecutivos três anos eu tracei todos os primeiros lugares…! É mole? Na categoria canto, com as músicas Calhambeque e Arrastão e na categoria declamação com o poema de Vinícius de Morais O Operário em Construção.
Não sei se vocês podem me imaginar cantando, num ano, o Calhambeque-bi-bi-te (versão Roberto Carlos) de calça de helanca azul boca de sino, colada na bunda, sapato de fivelão prateado e, noutro ano, arremessando os braços pra lá e pra cá, pra cima e pra baixo, no bom estilo Elis Regina, cantando a canção Arrastão do Edu Lobo. Pois foi o que aconteceu.
Consequentemente, portanto, quando em 1970 , a partir do convite de Ariano Suassuna para integrar o Quinteto Armorial, eu comecei a me interessar pelo universo dos brincantes populares, o meu espírito já estava preparado para fazer aquele grande mergulho brincante-cultural que me conduziu até aqui.
Posso dizer que tomar conhecimento dos brincantes ou folgazões, dançadores e músicos populares foi, naquela ocasião, como se eu tivesse sendo acometido de uma espécie de profundológico abalo sísmico cultural.
Imaginem novamente vocês que até aquele momento eu nunca tinha ouvido falar de bumba-meu-boi, maracatu, rabeca, cantadores, coco, embolada, mateus, frevo, etc. Aquele era para mim realmente um “admirável mundo novo” que se descortinava. Era o próprio realismo mágico em pessoa se revelando para mim.
Aliás, por essa época eu andava lendo o livro Sonhos, Memórias e Reflexões de Jung. Uma obra que guarda um pouco da mesma atmosfera onírica, lunar e cheia de maravilhas que eu descobria naquele universo que começava a vivenciar. Junguiando esse texto, acho que esse período corresponderia na minha vida a uma espécie de “iniciação aos mistérios do povo brasileiro”. Uso, aliás, a palavra mistério glosando um pouco aquele sentido dado a ela pelos antigos gregos quando iniciavam-se nos mistérios eleusinos. Através desses mistérios celebravam o regresso de Perséfone, representação mítica do retorno das plantas e da vida à terra no ciclo da primavera. De certa forma era isso o que eu sentia mesmo: uma espécie de retorno ou reencontro comigo mesmo, com as forças telúricas e vitais da minha natureza primaveril, através do rico e caudaloso imaginário popular. Durante vários e vários anos esse imaginário cultural por meio de cantos, danças, ritmos, entremeios teatrais, etc., me tomaria até à medula.
Bem, acho que vou parando por aqui hoje. Mas como não acabei ainda o danado do assunto Nascimento do Brincante, voltarei a ele ainda…
Salve.