A água e a boca do vulcão

By Antonio Nóbrega | 5 fevereiro 2015 | Sem Comentários

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Abri a porta do box para tomar banho e me pus de pé dentro de uma bacia colocada bem embaixo do chuveiro. Abri a torneira e à medida que a água começou a me molhar fui logo xampuando os cabelos. Fechei o chuveiro e ensaboei-me todo. Abri novamente a torneira e enquanto a água escorria pelo corpo e cabeleira (…) retirando a espuma, aproveitei ainda para sabonetar o rosto…

Quando terminei toda a operação vi que a água acumulada na bacia já dava pelo começo da canela e que supriria por duas ou três vezes a demanda de água para usar na privada.

E fui me enxugando pensando-perguntando: se fôssemos educados  dentro dessa atitude desde o dia em que tomamos banho pela primeira vez, se aprendêssemos desde muito cedo que os “dons” da natureza não são  infinitos e que nascemos para viver gregariamente, não nos pouparíamos, nós a nós mesmos, do vexame que passaremos em breve, ainda nós, os moradores da cafeinada  cidade de São Paulo?

Tenho para mim que o caso da água é só mais um sinal de alerta sobre quão perdulária é a nossa maneira de conviver com natureza. Não creio que estejamos usando da melhor maneira possível os recursos de nossa inteligência, pois, ao que parece, inflacionamos desmesuradamente a nossa porção cerebral impulsionadora de atitudes e atos inconsequentes, excessivamente individualistas, estúpidos. No caso da água, é bem verdade que o nosso governador não deveria ter sido tão omisso e incivil.  Desmereceu a sua função de guardião do estado e da sua gente. Mas não creio que seja unicamente pela via política que a questão pode ser resolvida.

A questão em jogo é muito maior. É um problema de natureza também conjuntural. Um problema do sistema-mundo em que vivemos. Estamos nos educando muito insatisfatoriamente para o exercício da vida em comum! A educação tal como é modernamente concebida não parece querer levar em conta certos aspectos. Falta-nos dar um sentido maior e integral  à palavra educação. Caminhamos bem no quesito educação formal. De uma forma ou de outra – aqui, acolá – ela tem prosperado: aprendemos matemática, geografia, tocar um instrumento musical, a nadar, a passar no vestibular, etc. Mas…

Estou pensando numa educação que, embora converse com essa, a ultrapasse, a transcenda.  Estou pensando numa educação cultural, humanística mesmo, aquela que leve em conta valores, visão de mundo, sentimento gregário, planetização, etc., aquela que nos ajude a ampliar, abrir as nossas consciências face aos problemas que, não nos iludamos, se não soubermos tratar, nos levarão à ruína… Estou pensando numa educação que nos faça compreender que somos todos parceiros de uma mesma jornada planetária e que se não nos irmanarmos nessa jornada única – tão bela quanto árdua – estaremos fadados a sermos puxados, irremediavelmente sem retorno e remissão, para dentro da boca do vulcão…Pois estamos ao seu redor…

O mundo tal como o conhecemos está desmoronando. Que mundo queremos e podemos (re)construir? Que outra escala de valores teremos de assentar nessa diferente Escola-mundo que almejamos? Que novos exercícios de humanidade teremos de nos impor?

Eram essas as questões que me invadiam enquanto tomava meu banho matinal com menos de um quinto da água que habitualmente utilizava…

 





A água e o consumo

By Antonio Nóbrega | 29 agosto 2014 | Sem Comentários

imagemaguaLi ainda há pouco na Folha de São Paulo que as regiões onde residem os paulistanos mais abastados são aquelas cujos índices de economia de água são as mais baixas. Se pensarmos que quem mora nessas regiões (eu sou um deles) são aqueles que  majoritariamente tiveram acesso à a boa escolarização, leem jornais e revistas,  são assinantes de televiumsão a cabo, estão ligados à internet continuamente, isso  parece ser um contrassenso. E é, realmente. Na busca da razão desse contrassenso o jornal não avançou. Aqui faço a pergunta: por que isso ocorre? A minha tentativa de resposta é a de que quanto mais dependemos do conforto, mais dificuldade temos em dele nos desapartar. Mais dele nos tornamos escravos. Ter água em fartura para lavar o carro ou o jardim, deixar a água caindo da torneira enquanto esquenta para fazermos a barba, não fechar o registro enquanto ensaboamos o corpo e tantos e tantos outros pequenos hábitos de conforto nos tornam cada vez mais dependentes de nossas fraquezas.

Num planeta finito, ou pelo menos com uma boa dose de finitude, não dá para vivermos a nosso bel prazer como se de alguma maneira as coisas fossem se arranjar por si mesmas, se autorregularem. Não irão. Se não conseguirmos nos educar para compartilhar, dividir e nos solidarizar uns com os outros nas pequenas e grandes causas, ficaremos cada vez mais dependentes dos nossos ferozes demônios interiores, cada vez mais sem forças para enfrentar os grandes desafios que parecem se desenhar no horizonte.  Eduquemo-nos!